REVISTA PARATUDO

O YOU TUBE MATOU O PASSADO – Álvaro Pereira Júnior

por | ago 6, 2011 | Paratudo | 6 Comentários

Acompanhe a coluna de Álvaro Pereira Júnior, na Folha de São Paulo, sobre o You tube. Um texto interessante.
Via Joana Peixoto, PUC GOIÁS.
ÁLVARO PEREIRA JÚNIOR



O YouTube matou o passado


São evidentes os pontos positivos de tanta informação. Mas talvez haja um lado perverso
Jovens de 14, 15 anos têm Renato Russo como ídolo. O líder da Legião Urbana morreu em 1996, mas os fãs de hoje talvez nem saibam, ou não se importem.
Porque Russo está vivo na internet, mais precisamente nos 27,8 mil vídeos que são obtidos ao se digitar “Renato Russo” ou “Legião Urbana” no campo de buscas do YouTube.
Estão lá as coreografias espasmódicas, como as de Ian Curtis (do Joy Division). O visual florido igual ao de Morrissey (dos Smiths). O mico no especial de Natal do Chacrinha, com a banda toda de chapeuzinho de Papai Noel. As letras sem fim, simplórias, mas sinceras. Renato Russo, vivo em voz e rosto. E essa perenidade on-line não é exclusividade dele. É geral.
O YouTube matou o passado. Além de exterminar mistérios e mitos.

Os Beatles fizeram um show em cima de um prédio, em 1969. Loucura! Soava como lenda para a meninada do meu tempo. Esse tipo de sentimento acabou. As lendas juvenis se tornaram realidade palpável. Basta procurar na web por “Beatles rooftop concert”. Show na íntegra, em alta definição.
Os Sex Pistols falando palavrões na TV inglesa, em 1976, num dos momentos mais marcantes da história do rock? A cena está na web. David Byrne em 1983, tenso, mordendo os lábios, incapaz de se comunicar com o apresentador David Letterman? Está on-line também. No século passado, um amigo dizia: “Das minhas dez bandas favoritas, nove eu nunca escutei”. Explicando: só conhecíamos aqueles grupos no papel, em revistas e em jornais importados.
Fotos espetaculares, nomes impossivelmente sonoros: Alien Sex Fiend, Sex Gang Children, June Brides, Inca Babies. Que som faziam? Não tínhamos ideia, exceto uma vaga noção de que deveria ser “dark” (o que atualmente é chamado de gótico). Hoje, essa paixão misteriosa seria impensável. Haveria dezenas de clipes na rede. E os exemplos não ficam só na música. Na ciência, poucos encontros foram mais importantes do que a conferência Solvay, de 1927. Meses antes, rejeitando a física probabilística, Albert Einstein sentenciara: “Deus não joga dados”.
Junto a ele, no congresso, debatiam intensamente Niels Bohr, Werner Heisenberg, Paul Dirac, Erwin Schrödinger, Wolfgang Pauli, Max Born e outros físicos estelares.
Um encontro monumental. Difícil acreditar que tivesse mesmo acontecido. Mas veja e creia: no YouTube, é “Solvay Physics Conference 1927”. O vídeo foi visto quase 115 mil vezes. Antes disso, deve ter mofado por anos, esquecido em algum arquivo de universidade. Era passado. Virou presente.
Na política, acontece algo semelhante. Em 1960, Richard Nixon foi massacrado por John Kennedy em um debate presidencial. O velho escroque republicano, inseguro, suarento e mal vestido, viu desaparecerem suas últimas chances de vitória diante do democrata bonitão e bem ensaiado.
Cresci lendo sobre esse debate, que Paulo Francis citava com frequência aqui mesmo na Folha. Passei anos imaginando como teria sido. Hoje, não seria necessário. O programa está na íntegra no YouTube (“Kennedy-Nixon debate”).
São evidentes os pontos positivos de tanta informação disponível. O rigor da comprovação factual. A fartura de fontes primárias. A falta de necessidade de intermediários ou epígonos: os originais estão todos à mão. Mas talvez haja um lado perverso desse “continuum”. Onde não há passado, não há ruptura. Se tudo está vivo, nada pode ser superado.
Um exemplo cristalino vem, de novo, da música. Na segunda metade dos anos 70, o punk inglês queria (e conseguiu) enterrar os dinossauros do rock grandioso e autoindulgente. Foi uma revolução, uma quebra de paradigma. A instalação de uma nova ordem (infelizmente, apenas musical).
Hoje, no entanto, é difícil pensar em um fenômeno do tipo. Nada vai embora de verdade. O leitor de estômago mais forte pode procurar no YouTube por “Emerson Lake Palmer Gnome” e rapidamente verá o trio progressivo assassinar a suíte para piano “Quadros de uma Exposição”, do compositor clássico Modest Mussorgsky.
No YouTube, Emerson, Lake and Palmer estão tão vivos quanto os Sex Pistols. O que talvez explique a situação da música atual, onde tudo é válido, manso, todos se amam e não se enxerga conflito geracional. Tema para uma próxima coluna.


cby2k@uol.com.br

EDITO RIAL

A Revista Paralax é também fruto da construção criativa e responsiva do Paralelo Amarelo: plataforma que comunica arte, cultura, arquitetura, urbanismo, design e fotografia, com uma ênfase em nossa produção regional.

ISSN 1018-4783

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6 Comentários

  1. Alb

    discordo. só isso. "matou o passado" e daí meu amigo? Detonado o trampo do youtube? Intelectiuais dormem de calça jeans???????? relax mam! Mamilos são polemicos!

    vcs estudam demais!

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  2. Unknown

    Não é o caso, mas achei interessante a posição do 'intelectual' como você colocou. Aliás é a função do camarada, estudar, dizer o que outros talvez nem imaginem.
    E se você ler o texto vai perceber que longe de 'detonar' o trabalho do You tube, o texto só faz pensar um pouquinho. Coisa difícil nestes dias.
    Acho que as palavras são mais polêmicas que os mamilos. Os últimos se expuseram muito, no You tube e em outros canais.

    Valeu pela comentário, Alb.

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  3. Alb

    ah, não! pra mim é mais um desfile de "como eu tenho referências e você não, tolo!" Metade dos nomes citados nem vão ser absorvidos pela massa. ONo youtube existe canais, portanto locais de coisa tops dea erudição, e canais de bobagens… O que seriam de outros serviços na web que linkam videos? Essa "morte do passado" ae, muito pessoal. é o mesmo que grilar com videos religiosos ou pornografia… ("Coisa dificil nesses dias") A falta de sintese impera!!! Blá blá blá! O dia que o twitter influênciar as teses o mundo vai mudar pra melhor. As ideias ficam engavetadas por tão enfadonhas de serem lidas. rsssss Eu li 86% porque ler tanta referencia me destraia do conteudo em sí rssss

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  4. eliana moura

    Tem uma coisa na leitura de textos que se chama "extrapolação". Ela pode ser tanto positiva quanto negativa. A negativa faz a gente, na correção das redações de vestibular ou em orientações corriqueiras da produção textual , dar zero a um posicionamento dissertado. A positiva demonstra domínio das ferramentas textuais e crítica lúcida. A sua extrapolação foi negativa, Albérico. O propósito do texto nada tem que ver com citação exaustiva de referências ou exaltação de intelectos. O propósito do texto é demonstrar o que jornais, revistas e pesquisas intensas têm apontado: hoje nós temos acesso a informações (de todos os gêneros: desde a comunidade científica até os pagodes de laje) que, antes, seriam apenas algo de que "ouvimos falar". Parabéns ao Álvaro Junior pela pesquisa realizada, que responde à função do jornalismo. Talvez eu nunca teria tempo de descobrir por mim mesma. Taí a realidade do texto do Álvaro viva aqui nos comentários. Nossas ideias a respeito do texto só existem porque, pela internet, tivemos acesso ao que, antes, talvez, não teríamos.Cada área do conhecimento merece seu lugar, por prestar um serviço à comunidade. Abraços!

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  5. eliana moura

    Brau, acho que o comentário foi com o nome da Redenção, mas eu não consigo mudar aqui na janelinha!

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  6. Unknown

    Eliana, o comentário saiu como Igreja Batista Redenção, você deve estar logada nele.:)
    Ótimo comentário. Aliás profundo pacas.
    Um abraço.

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